quinta-feira, 5 de abril de 2012

O Ministério Público pode conduzir investigações criminais?

   
   Candente é a discussão acerca dos poderes investigatórios (em matéria criminal) do Ministério Público, dividindo opiniões.
   Está em tramitação no STF uma Ação Direta de Inconstitucionalidade tratando exatamente desta questão, a ADI 4.220 (que não é a única neste tema).
   Pouco a pouco os posicionamentos vão se consolidando, cada um dando seu pitaco jurídico à espera do pronunciamento final pelo nosso Supremo Tribunal.
   Esta semana veio a público o entendimento da Advocacia-Geral da União (AGU), que se manifestou na referida ADI no sentido da inconstitucionalidade da Resolução20/07 do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que autorizaria a investigação criminal pelo MP.
   De outro lado, sustentam alguns que o MP possui, sim, poderes investigatórios criminais, fundamentando tal alegação – dentre outros argumentos – na "teoria dos poderes implícitos", segundo a qual, resumidamente, quando a Constituição outorga determinada atribuição a um órgão/instituição, implicitamente também atribui competência para o exercício dos meios necessários à atribuição principal.
   Assim, se o MP possui poderes para promover a ação penal pública (atribuição maior), não haveria como negar-lhe o poder de buscar a prova para a ação (atribuição intermediária). Nesse sentido já decidiu a 2ª Turma do STF no RE 535.478, enfatizando-se que no julgado ficou registrado que o poder investigatório seria “em algumas hipóteses”, quando verificado algum motivo especial a autorizar a investigação pelo MP. Cumpre ressaltar que o tema foi abordado no referido Recurso Extraordinário pela via reflexa, não sendo objeto imediato do processo a eventual inconstitucionalidade da Resolução do CNMP.
   Como dito, a questão é altamente polêmica.
   Feitas estas breves considerações introdutórias, objetivando facilitar a compreensão do tema, transcrevo a notícia veiculada sobre o posicionamento da AGU para que possamos melhor refletir a respeito do assunto, aguardando o pronunciamento do Plenário do STF:
   
   "Ao Ministério Público cabe o controle externo da atividade policial, mas não a própria função exercida pela Polícia. A opinião é da Advocacia-Geral da União, ao encaminhar ao Supremo Tribunal Federal manifestação sobre artigo da Resolução 20/07, do Conselho Nacional do Ministério Público, que autoriza o MP Federal a fazer investigações criminais. Para a AGU, o dispositivo é inconstitucional.
   O órgão cita a Lei Complementar 75/93, que garante a fiscalização da Polícia pelo MPF por meio do livre ingresso em delegacias e prisões, do acesso a quaisquer documentos relativos à atividade policial, do pedido de instauração de inquérito policial sobre a omissão ou fato ilícito ocorrido no exercício da atividade policial e da propositura de ação penal por abuso de poder.
   Além disso, diz a AGU, o artigo 29 [129] da a Constituição prevê que o MPF pode "requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicando os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais". Já o artigo 144 da Constituição deixa claro que cabe à Polícia Federal apurar infrações penais e "exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União". Os advogados da AGU enfatizam que, de acordo com a Constituição, cabe à Polícia fazer a investigação criminal, "sempre sob os olhares atentos do Ministério Público, para que este órgão possa avaliar — na qualidade de defensor da ordem jurídica — se é caso ou não de deflagrar a ação penal cabível".
   'A partir do momento em que o Ministério Público se utiliza de sua estrutura e de suas garantias institucionais a fim de realizar de modo direto investigações criminais, atua em sigilo e isento de fiscalização em sua estrutura administrativa', afirma.
   A AGU afirma também que, no âmbito do Congresso Nacional, já houve a Proposta de Emenda Constitucional 1971/2003, que pretendia alterar a redação do artigo 129 da Constituição, para incluir dentre as atribuições do Ministério Público a possibilidade de realizar investigação criminal. Essa proposição, para a AGU, 'demonstra que a atual conformação constitucional não legitima o exercício dessa competência pelo órgão ministerial'.
   A manifestação foi apresentada na Ação Direta de Inconstitucionalidade 4.220, proposta pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil contra o artigo da resolução do CNMP. Para a OAB, ao regulamentar o controle externo da atividade das polícias, a resolução viola a Constituição, uma vez que não foi dada competência ao CNMP para editar tal norma. Segundo a Ordem, a Constituição, a partir da Emenda 45/04 (da Reforma do Judiciário), delimitou as competências do CNMP como sendo 'de controle da atuação administrativa e financeira do Ministério Público e do cumprimento dos deveres funcionais de seus membros (artigo 130-A, parágrafo 2º)'.
   O caso agora está com a Procuradoria-Geral da República para que se manifeste sobre a ação. O relator é o ministro Luiz Fux. Com informações da Assessoria de Imprensa da AGU e da OAB".
Fonte: Revista Virtual do Consultor Jurídico de 04 de abril de 2012.

Um comentário:

  1. Reação do MP em relação à manifestação da AGU:


    "Quando o Supremo Tribunal Federal decidiu, em 2010, que o Ministério Público tem autorização legal para investigar, limitou essa liberdade apenas para apuração de crimes cometidos por policiais no exercício da função. Em qualquer outra situação, não há previsão legal que fundamente que o órgão tome a frente dessa fase do processo.

    Esse é o entendimento manifestado pela Advocacia-Geral da União nesta semana a respeito da Ação Direta de Inconstitucionalidade em que a Ordem dos Advogados do Brasil questiona regra do Conselho Nacional do Ministério Público que autoriza os membros do MP a investigar. Para a AGU, a norma editada pelo Conselho permite a interpretação de que membros do MP possam agir em situações não previstas no acórdão do Supremo.

    No entanto, o CNMP reputa a ADI a uma interpretação errada da norma, já que o órgão não abriu a possibilidade de participação dos promotores e procuradores em toda e qualquer investigação.

    A AGU concordou com a OAB em relação a dois pontos da Resolução 20/2007, considerados inconstitucionais. São eles o parágrafo 1º do artigo 4º, que trata da responsabilidade do MP em investigações que envolvam diretamente policiais no exercício da função, e a parte que confere ao CNMP o exercício de controle externo sobre as atividades-meio das corporações policiais.

    A opinião da AGU foi solicitada pelo STF por conta da ADI 4.220, impetrada pelo Conselho Federal da OAB contra a resolução. “Causa estranheza o parecer da AGU e o pedido da OAB, pois tiraram o foco do controle externo para pôr reparo em matéria em que já há jurisprudência no STF”, afirma Mário Bonsaglia, procurador regional da República e conselheiro do CNMP.

    Para a AGU, no entanto, a questão ainda não está pacificada no Supremo, havendo decisões nos dois sentidos, tanto reconhecendo a possibilidade de o MP investigar criminalmente, quanto entendendo que esse procedimento fere dispositivos da Constituição. Assim, a manifestação estaria fundamentada em decisões da própria corte.

    Bonsaglia criticou o fato de a AGU não defender o CNMP. “O Conselho é um órgão público federal e é função constitucional da AGU defender as entidades do governo”, diz. Mas a AGU sustenta a tese de que seu compromisso é mais com a defesa da presunção de constitucionalidade dos atos normativos do que com interesses de órgãos específicos.

    Em agosto de 2009, o então advogado-geral da união e hoje ministro do STF José Antônio Dias Toffoli já havia considerado que a Resolução 20 da CNMP era inconstitucional, em Adin movida pela Associação dos Delegados de Polícia do Brasil (Adepol).

    A ADI 4.220 foi ajuizada em março de 2009. O presidente da Ordem, Ophir Cavalcante Junior, lembra que o motivo da ação foi o fato de que “na época se vivia um estado policial muito forte, com operações espetaculosas, muito mais midiáticas do que eficientes. Por conta disso, o Conselho Federal se reuniu e entendeu que não caberia ao Ministério Público fazer investigações”.

    A Ordem é a favor da investigação, por parte do MP, apenas em casos de policiais que não cumprirem seu dever, ou quando há, por parte deles, desrespeito ao cidadão. No entanto, é contra a investigação nos demais casos. “O fato de o titular da Ação Penal fazer também a investigação pode gerar, em tese, uma situação de parcialidade”.

    O conselheiro Mario Bonsaglia discorda. “Tudo o que o MP faz passa por análises judiciárias, o que elimina qualquer traço de parcialidade”, garante. Ele também acredita que, se o Ministério Público pudesse fazer investigações de qualquer natureza, a rigidez na qualidade da administração pública seria maior. “Quem tem os fins deve ter os meios, e quem tem o poder de executar as ações deve também fazer a colheita”.

    A ação, cujo relator é o ministro Luiz Fux no STF, aguarda ainda parecer da Procuradoria-Geral da União para começar a ser julgada pela corte".

    (notícia também veiculada na Revista do Consultor Jurídico, em 4 de abril de 2012):

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