sexta-feira, 10 de agosto de 2012

50% em cotas

   O Senado aprovou na noite desta terça-feira (7) projeto que reserva metade das vagas nas universidades federais e nas escolas técnicas do país para alunos que cursaram todo o ensino médio em colégios públicos. Além disso, estabelece a divisão dessas vagas com base nas raças dos estudantes.


   O projeto segue agora para sanção presidencial da Dilma RousseffHavendo sanção, as universidades terão o prazo de quatro anos para implementar progressivamente o novo modelo de cotas. A cada ano, elas ficam obrigadas a reservar 25% do total de vagas destinadas aos cotistas.
   Na prática, o projeto mais do que dobra o total de vagas destinadas a cotas nas federais.
   O texto ainda prevê que as cotas devem ser prioritariamente ocupadas por negros, pardos ou índios. A divisão deve considerar o tamanho de cada uma dessas populações no Estado, segundo o censo mais recente do IBGE. Se houver sobra de vagas, elas irão para os demais alunos das escolas públicas.
   Dos 50% reservados para cotas, metade das vagas será destinada a alunos com renda familiar de até R$ 933,00 por pessoa. Nesse grupo, também é preciso respeitar o critério racial. Assim, os 50% restantes das cotas podem ser ocupados por quem tem renda maior, desde que seja obedecido o critério racial.
   O tema tramitava havia 13 anos no Congresso, mas, por ser polêmico, só foi aprovado depois que o governo mobilizou aliados.
   O projeto prevê que as cotas irão vigorar por dez anos. Depois disso, haverá revisão do tema com o objetivo de verificar se o modelo deu certo.
   "É um período de transição para garantir a igualdade na seleção", disse a senadora Ana Rita (PT-ES), uma das relatoras do texto.

Folha - O projeto não fere a autonomia universitária?
Ana Rita - Autonomia não é soberania. Estamos falando de universidade pública mantida por recursos públicos. O acesso precisa ser para todos e cabe ao poder público assegurar esse direito.

Por que metade das vagas?
O projeto tramita desde 1999. Passou por um longo período de discussões. Foram feitas várias modificações. A redação é a melhor e mais consensual possível.

Em que nível cotas promovem justiça social?
Jovens negros têm 140% mais chances de serem mortos em crimes que brancos. Com mais acesso às universidades, eles podem estar menos nas ruas e ser menos expostos. Também é preciso ser mais justo com a composição do país, pois 50,7% das pessoas são pretas ou pardas e 0,4% indígena.

O critério de raça não vai se sobrepor ao econômico?
Não. O critério social é o primeiro levado em conta. Metade dessas vagas será para alunos de famílias com renda per capita de até 1,5 salário mínimo. As cotas raciais serão contempladas de acordo com a realidade de cada Estado, independentemente da renda.

As universidades não podem perder em qualidade?
De maneira nenhuma. Alunos cotistas têm desempenho igual ou até superior ao dos não cotistas.

   VESTIBULAR:
   Um trecho aprovado deve ser vetado pela presidente Dilma Rousseff. Ele estabelece que o ingresso por meio de cotas deve ocorrer pela média das notas do aluno no ensino médio, sem vestibular ou sistema similar.
   Para facilitar a aprovação no Senado, o Palácio do Planalto prometeu vetar essa mudança.
   A votação foi simbólica. Apenas o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) se declarou contrário ao projeto."Ao colocar todas as instituições no mesmo molde, estamos ferindo a autonomia da universidade. Estabelecemos de fora para dentro um critério", afirmou.
   O senador Paulo Paim (PT-RS), um dos principais defensores do projeto, disse que a mudança faz um resgate social dos negros no país."Quem é negro sabe o quanto o preconceito é forte. A rejeição desse projeto significaria não querer que os negros, índios e pardos tenham acesso à universidade."

   REAÇÃO DAS ESCOLAS PARTICULARES:
   As escolas particulares reagiram ao projeto aprovado no Congresso Nacional que reserva 50% das vagas das 59 universidades federais a alunos da rede pública e ameaçam ir à Justiça.
   A Fenep (Federação Nacional das Escolas Particulares) criticou o texto e diz que estuda contestar a norma judicialmente. "Existe um questionamento jurídico que a gente pode fazer, e estamos estudando a matéria", disse a presidente, Amábile Pacios.
   Ela reconhece a necessidade de políticas para setores historicamente desfavorecidos, mas diz que o caminho escolhido não é o adequado.
   Para Pacios, é necessário primeiro o governo melhorar a qualidade da rede pública de educação básica em vez de priorizar medidas que foquem o ensino superior.
   "A igualdade é garantir para esses meninos [beneficiados pelo projeto] uma escola pública de qualidade. Não é fechando a entrada dos alunos das particulares que você corrige isso", afirma.
   Ela pondera ainda que o projeto prejudica alunos bolsistas das escolas privadas. "Você está pagando uma dívida e formando outra."

   O QUE PENSAM OS REITORES?
   Os críticos ao projeto afirmam que o texto em tramitação no Senado fere a autonomia das universidades federais, prevista na Constituição.
   A Andifes (associação de reitores) e a SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência) dizem que, ao determinar um modelo fixo de reserva de vagas, a proposta retira o poder dos conselhos universitários de definir os critérios para ingresso dos alunos.
   "Faz parte da autonomia didático-científica a definição pela universidade da sistemática para a seleção dos estudantes ingressantes", afirmou, em nota, a presidente da SBPC, Helena Bonciani Nader.
   Das 59 universidades federais existentes, 32 adotam modelos distintos de reserva de vagas. Mas apenas 11 destinam 50% das cadeiras para cotistas. Outras 14 nem sequer adotam cotas.
   Para o secretário-geral da Andifes, Gustavo Balduino, a proposta não leva em consideração "contextos socioeconômicos distintos" de cada uma das universidades.
   Apesar de ser favorável às cotas, o secretário diz que o projeto obriga as universidades a mudar modelos que deram certo."É uma aposta no escuro."
   Já para o professor Ivair Augusto dos Anjos, diretor do Centro de Convivência Negra da UnB (Universidade de Brasília), o projeto é uma garantia para não haver retrocessos.
   Isso porque, na maioria das universidades, o modelo de cotas tem prazo para a sua aplicação e precisa ser sistematicamente rediscutido.

   ONG EDUCAFRO
   A ONG Educafro, que pressiona o Senado pela aprovação do texto, diz que não há argumentos consistentes contra a proposta uma vez que o STF decidiu, em abril passado, pela constitucionalidade das cotas.
   "Nós não queremos programas tímidos. Esse projeto é o mínimo que esperamos que aconteça", disse o diretor da ONG, frei David Santos.

Fonte: Folha.com

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